4 de jun. de 2012

EDUARDO COUTURE / 3º Mandamento - Trabalha



               
                  por Pedro Luso de Carvalho
                 


        O advogado sabe que o exercício da advocacia não tem o fascínio que muitas vezes é mostrado em filmes e romances. E, por outro lado, não se pode dizer que o advogado leva uma vida de aventuras, e que pratica atos heróicos; ao contrário, o seu dia-a-dia é, muitas vezes, monótono, quando passa horas e horas na frente de papéis, analisando-os, para ver se alguns desses documentos podem ajudá-lo na ação que vai ajuizar em nome de seu cliente, para defender direito supostamente desrespeitado.

        Eduardo Couture, que foi um dos mais importantes processualistas sul-americanos, conhecia de perto essa realidade, e, como jurista e professor que era, não poderia guardar para si essa vivência, o que não é de se estranhar pelo natural cacoete de quem exerce tais atividades, e que, justamente em razão de sua experiência elaborou o terceiro dos dez mandamentos do advogado (“III. Trabaja. La Abogacía es una ardua fatiga puesta al servicio de la Justicia”); vejamos, pois, o seu terceiro mandamento (In COUTURE, Eduardo. Os Mandamentos do Advogado. Tradução de Ovídio A. Baptista da Silva e Carlos Otávio Athyde. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1979), como segue:

                                               [ESPAÇO DO 3º MANDAMENTO]


                                                               "TRABALHA"
                                                                         (Couture)     


       Quem quiser saber em que consiste o trabalho do advogado, deverá compreender o seguinte: de cada cem assuntos que passam pelo escritório de um advogado, cinqüenta não são judiciais. Trata-se de conselhos, orientações e idéias em matéria de negócios, assuntos de família, prevenção de futuros litígios, etc. Em todos esses casos, a ciência cede lugar à prudência. Dos dois extremos do dístico clássico que define o advogado, o primeiro predomina sobre o segundo, e o ome bueno se sobrepõe ao sabedor del derecho.

        Dos outros cinqüenta, trinta são rotineiros. Consistem em pesquisas e buscas em cartórios, pedidos de documentos, questões de jurisdição voluntária, defesas singelas ou processos sem oposição. Nessa atividade não contenciosa, o gabinete do advogado pode transformar-se num escritório de tramitação de documentos. Seu lema poderia ser, então, como o das grandes companhias que produzem artigos domésticos: more and better service for more people.

        Dos vinte restantes, quinze oferecem alguma dificuldade e exigem um trabalho mais intenso. Contudo, ainda se trata de uma espécie de dificuldade e exigem um trabalho mais intenso. Contudo, ainda se trata de uma espécie de dificuldade que a vida nos oferece a cada passo e que a dedicação e o esforça de um homem laborioso e inteligente são acostumados a vencer.

        Nos cinco restantes, encontra-se a essência mesma da advocacia. São os grandes casos da profissão. Grandes, não certamente por sua expressão econômica, senão pela magnitude do esforço físico e mental que exigem do profissional. Causas aparentemente perdidas, por cujas fissuras penetra um raio de luz através do qual o advogado abre seu caminho; questões complexas que devem ser sustentadas por meses e por anos e que exigem um sistema nervoso equilibrado, sagacidade, altivez, energia, previsão, autoridade moral e fé absoluta no triunfo.

        A perícia no trato desses complexos assuntos outorga ao advogado o título de princeps fori. A Opinião pública julga o trabalho do advogado, e sua dedicação a ele, com o mesmo critério com que confere o título de campeões olímpicos: pela reserva de energias para decidir a contenda no momento final”.


                                                                             *  *  *

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