– PEDRO LUSO DE CARVALHO
Por ocasião da realização de negócio jurídico, cujo objeto seja bem
imóvel (terreno, casa ou apartamento), com pagamento feito mediante prestações
mensais, acrescidos da quantia dada a título de arras, é natural que vendedor e
comprador tomem os cuidados necessários para o caso de descumprimento do ajuste
firmado, que poderá resultar na rescisão do contrato, por culpa de uma das
partes. Tal precaução visa impedir que a parte inocente arque com prejuízos
injustificáveis, como, por exemplo, a perda da integralidade dos valores
alcançados, quer como arras, quer como pagamento das prestações, na hipótese da
não-execução do contrato.
No caso sob-hipótese, não pode o comprador, que deixa de pagar as
prestações ajustadas no contrato de promessa de compra e venda, perder toda a
quantia dada a título de sinal de pagamento, e de prestações, ainda não
integralizadas, mesmo sendo ele o responsável pela a não realização do negócio
jurídico convencionado. Se assim fosse, configurar-se-ia enriquecimento sem
causa, vedado tanto pelo Código Civil, como pelo Código do Consumidor.
Nesse sentido, a Terceira Turma Recursal Cível do Tribunal de Justiça do
Estado do Rio Grande do Sul RS, que teve como Relator o Dr. Carlos Eduardo
Richinitti, manifestou-se ao julgar o Recurso Inominado nº 71001288059, em 07
de agosto de 2007, como se vê pela ementa abaixo:
“RESCISÃO CONTRATUAL.
RECIBO DE ARRAS. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. DEVOLUÇÃO
DAS PARCELAS PAGAS. ABATIMENTO DO PERCENTUAL CORRESPONDENTE A 20% A TÍTULO DE
PERDAS E DANOS SOBRE OS VALORES A SEREM RESTITUÍDOS. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO
DESPROVIDO”.
Cumpre ainda dar ênfase à parte do voto do Relator, in verbis:
“Não assiste razão à
recorrente. A sentença de primeiro grau bem examinou a matéria trazida aos
autos, devendo ser mantida por seus próprios fundamentos. Acresço. Em um
contrato de compra e venda rescindido, a retenção de todos os valores pagos e a
restituição do bem configuram enriquecimento sem causa, pelo que correta a
decisão de determinar a restituição, mediante a retenção de um percentual a
título de perdas e danos”.
O Relator prossegue com o seu voto citando duas importantes decisões das
Turmas Recursais, do Juizado Especial Cível, como segue:
“EMENTA: ARRAS. CONTRATO
IMOBILIÁRIO. DESISTÊNCIA DO CONSUMIDOR. RESTITUIÇÃO INTEGRAL DOS VALORES PAGOS,
INCLUSIVE A TÍTULO DE COMISSÃO DE CORRETAGEM, MAS ABATIDO O PERCENTUAL DE 10%
PARA A COMPENSAÇÃO DE DESPESAS. PRECEDENTES DAS TURMAS RECURSAIS. RECURSO
PARCIALMENTE PROVIDO. (Recurso Cível Nº 71000710624, Segunda Turma Recursal
Cível, Turmas Recursais - JEC, Relator: Mylene Maria Michel, Julgado em 10/08/2005).
EMENTA: RESTITUIÇÃO DE VALORES. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL.
ARRAS. RESCISÃO. DEVOLUÇÃO DO VALOR REFERENTE ÀS ARRAS. CONFIGURADA RELAÇÃO DE
CONSUMO. INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. RECURSO PARCIALMENTE
PROVIDO APENAS PARA ABATER O PERCENTUAL CORRESPONDENTE A 10% A TÍTULO DE PERDAS
E DANOS. (Recurso Cível Nº 71000603019, Primeira Turma Recursal Cível, Turmas
Recursais - JEC, Relator: Luiz Antônio Alves Capra, Julgado em 17/02/2005).
Por fim, o relator emite o seu voto, in verbis:
“Ante o exposto, voto em negar provimento ao recurso para o fim de
manter a sentença de primeiro grau por seus próprios fundamentos. Sucumbente,
arcará a recorrente com as custas e honorários advocatícios no percentual de
20% sobre o valor da condenação”.
Acompanharam os votos do relator, o Dr. Eugênio Facchini Neto, e a Dra.
Maria José Schmitt Sant Anna, que, na qualidade de Presidente Terceira Turma
Recursal Cível, assim proclamou o resultado do julgamento do Recurso Inominado
Nº 71001288059, Comarca de Santana do Livramento: negaram provimento ao
recurso. Unânime.
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