30 de nov. de 2008

PRISÃO CIVIL POR DÍVIDA DE ALIMENTOS

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por Pedro Luso de Carvalho
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Os artigos 732 e 733 do Código de Processo Civil dão o norte para as formas de execução nos casos em que o devedor de prestação alimentícia torna-se inadimplente. O art. 732 dispõe que, nos casos de condenação ao pagamento de pensão de alimentos, a execução de sentença deverá atender o que prescreve o Capítulo IV, do Título II. E, na hipótese de o executado vier a interpor embargos do devedor, depois de oferecer dinheiro como penhora, mesmo assim o exeqüente poderá levantar a importância da prestação, mensalmente.


Portanto, nos casos em que o alimentante seja condenado a pagar pensão de alimentos ao alimentando, este terá a seu favor título líquido e certo (como se fora duplicata, letra de câmbio, cheque ou qualquer outro tipo de contrato exeqüível), que, por sua natureza, lhe dará o direito de promover ação de execução contra o devedor inadimplente, desde que a sentença já tenha transitado em julgado. Quanto aos trâmites dessa ação, o código processual prevê a possibilidade de o devedor interpor embargos do devedor, depois que este tenha oferecido bens à penhora para segurar o juízo, ou que tais bens tenham sido indicados pelo credor, havendo inércia daquele. Mas, não será neste artigo que trataremos com mais de profundidade essa forma de execução, que, em razão de suas peculiaridades, exige um maior espaço. Então, o próximo trabalho será sobre o art. 732, do CPC.


No trabalho de hoje, abordaremos a execução de sentença, ou de decisão na qual o juiz fixa alimentos provisionais, na forma prevista pelo art. 733 do Código de Processo Civil. Com base nesse artigo, estando o alimentante inadimplente o juiz mandará citá-lo para que efetue o pagamento no prazo de três dias, sob pena de, não o fazendo, ser-lhe decretada a prisão pelo prazo de um a três meses. Diga-se, que, no tocante ao prazo de três meses, a jurisprudência vem decidindo que o prazo máximo deverá ser de dois meses, como veremos adiante, e não como o que estatui o § 1º do art. 733 (§ 1º. Se o devedor não pagar, nem se escusar, o juiz decretar-lhe-á a prisão pelo prazo de 1 (um) a 3 (três) meses).


Também no que diz respeito ao que estatui o CPC, no seu art. 733, caput (Na execução de sentença ou de decisão, que fixa os alimentos provisionais, o juiz mandará citar o devedor para, em 3 (três) dias, efetuar o pagamento, provar que o fez ou justificar a impossibilidade de efetuá-lo) , bem como no disposto nos seus parágrafos (§ 2o. O cumprimento da pena não exime o devedor do pagamento das prestações vencidas e vincendas [Redação dada pela Lei nº 6.515, de 26.12.1977]. § 3o. Paga a prestação alimentícia, o juiz suspenderá o cumprimento da ordem de prisão), constituir-se-á no terceiro trabalho sobre as execuções por dívida de prestação de alimentos previstas nos artigos 732 e 733.


Hoje ficaremos com o prazo da prisão civil em decorrência da falta de pagamento da prestação alimentícia, prisão essa que será decretada pelo juiz depois de terem se esgotado os momentos legais para o devedor pagar a dívida ou de justificar o motivo que o impediu de pagá-la. Nesse sentido, a Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, tendo como Relator o Des. Rui Portanova, julgou Habeas Corpus nº 70017272337, em 30/11/2006, cuja publicação, no Diário da Justiça, deu-se no dia 11/12/2006.


“EMENTA - HABEAS CORPUS. PRISÃO POR DÍVIDA DE ALIMENTOS. PRAZO. REGIME. O prazo máximo para prisão civil por dívida de alimentos é de 60 dias. No caso, a prisão deve ser cumprida em regime fechado. CONCEDERAM PARCIALMENTE A ORDEM.


VOTOS - DES. RUI PORTANOVA (RELATOR) - O PRAZO DE PRISÃO. Alega o impetrante que o decreto prisional é gerador de constrangimento ilegal, visto que estabelece o prazo de 90 dias para cumprimento da prisão civil, o que malfere o artigo 19 da Lei nº 5.478/68, que fixa o prazo máximo de 60 dias, com o que é nulo o ato judicial respectivo. Neste ponto, estou em que o parecer do digno Procurador de Justiça, Dr. Ricardo Moreira Lins Pastl, traz fundamentos suficientes.


Assim: As alegações do impetrante são parcialmente fundadas, observando-se que o ato judicial questionado fixou a prisão civil em três meses, pelo regime de cumprimento integralmente fechado (fl. 11), sendo procedente a alegação de ilegalidade do prazo de noventa dias imposto pela decisão em comento. Isso porque, como bem consignou a ilustre relatoria na decisão das fls. 51-52, o prazo máximo previsto no ordenamento jurídico pátrio é de 60 dias, em qualquer caso, lição que é encampada, dentre outros, por Araken de Assis (Da Execução de Alimentos e Prisão do Devedor, 4ª ed., RT, p. 144) e Sérgio Gischkow Pereira (Ação de Alimentos, 3ª ed., SAFE, p. 69).

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Nesse sentido, anote-se: Habeas corpus. Execução de alimentos. A decretação de prisão civil pelo prazo de 90 dias mostra-se abusiva, autorizando o deferimento da presente impetração. Ordem concedida (Habeas Corpus nº 70005082292, Oitava Câmara Cível, TJRS, relator Des. Antônio Carlos Stangler Pereira, julgado em 24/10/2002).


O “REGIME DA PRISÃO”. O pedido de habeas corpus, traz ainda para debate a questão pertinente ao regime. Convém salientar que, no rigor, não há regime legal estipulado para o cumprimento da prisão civil por inadimplemento de pensão alimentícia. Por isso, a epígrafe deste ponto está entre aspas. O que existe é o Ofício-circular da CGJ que, apenas, faz uma recomendação. Antes de mais, convém mais uma vez repetir as palavras do Ministério Público deste grau de jurisdição:


‘No entanto, entende esta Procuradoria de Justiça que são infundadas as alegações respeitantes ao requerimento de modificação do regime prisional, com o devido respeito pela conclusão diversa – abraçadas inúmeras vezes por esse órgão fracionário do Tribunal e objeto de recomendação da egrégia Corregedoria-Geral da Justiça –, não se podendo aceitar a pretensão de cumprimento da ordem prisional em regime “aberto”, posto que a medida de custódia executiva refoge da disciplina penal, não sendo, pois, aplicáveis à espécie as regras executivas criminais (assim, Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, 6ª Câmara Cível, HC nº 586059172).


É que, como bem salienta Araken de Assis (em Da Execução de Alimentos e Prisão do Devedor, 4ª ed., RT, 1998, p. 145), nenhum estímulo real sobre o devedor relapso existiria se o meio executório não se prestasse como “vis compulsiva” a obrigá-lo à observância ao julgado.


Em outras palavras, a utilidade do meio processual eleito pelo credor depende, justamente, da efetiva privação de liberdade do apenado, segregação essa que, assim, é de imperativa imposição. Não é outra lição abraçada por Yussef Said Cahali (em Dos Alimentos, 2ª ed., RT, 1993, pp. 842 e 843), quando giza que a prisão albergue, ou similar seu, seria uma simulação de prisão, que desnaturaria o próprio teor coativo da prisão civil.


Sendo assim, no que diz respeito ao regime determinado para o cumprimento da decisão, não há ilegalidade na ordem. Não perco de vista que, toda a execução é real. A execução de alimentos é a única exceção, pois no confronto entre os valores “VIDA” do alimentado, e “LIBERDADE” do alimentante, prevalece o valor “VIDA”.


A prisão para quem não paga alimentos, portanto, não é fim, mas sim meio: restringe-se a LIBERDADE do alimentante como meio de coagi-lo a cumprir sua obrigação e garantir a VIDA do alimentado.


Os regimes aberto ou semi-aberto, que se limitam a impor ao alimentante inadimplente o recolhimento à noite ao estabelecimento prisional, não restringem sua liberdade de maneira efetiva. Não há verdadeiro “sacrifício” da LIBERDADE. Via de conseqüência, não há garantia efetiva para a VIDA.


No confronto entre a lei (e suas razões) e o provimento da Corregedoria (e sua sugestão) a Câmara tem adotado solução absolutamente adequada. Assim, a cada caso concreto se vai aprofundar a análise das peculiaridades e se buscar a solução mais justa. Por isso, é indispensável, abrir-se um novo item para análise do que, neste caso aqui em debate, temos de circunstâncias que possam conduzir a uma ou outra solução.


CASO CONCRETO. O paciente faz apenas trabalhos esporádicos, e ainda assim apenas aos finais-de-semana. Note-se que ao indeferir a justificativa apresentada, o juízo reconheceu (ainda que implicitamente) que o devedor tinha – e tem – condição de pagar imediatamente o que deve. Logo, não há razão para agraciá-lo com o regime aberto, na perspectiva de que ela possa continuar trabalhando para, no futuro, pagar o que deve.


Se a justificativa foi rejeitada é porque ficou assentado o entendimento de que o devedor pode pagar agora o que deve. E se ele pode pagar agora e ainda não pagou, então talvez o regime fechado seja justamente a medida necessária para coagi-lo a adimplir o débito.


ANTE O EXPOSTO, concedo parcialmente a ordem, apenas para que o prazo de cumprimento da prisão seja reduzido para 60 dias. DES. CLAUDIR FIDÉLIS FACCENDA - De acordo. DES. JOSÉ ATAÍDES SIQUEIRA TRINDADE - De acordo. DES. RUI PORTANOVA - Presidente - Habeas Corpus nº 70017272337, Comarca de Rodeio Bonito: "CONCEDERAM PARCIALMENTE A ORDEM. UNÂNIME."
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