9 de fev. de 2020

DA DOAÇÃO


 PEDRO LUSO DE CARVALHO

O Instituto da Doação está regulado pelos artigos 538 a 554, Seção I, do Capítulo IV, do Título VI, da Lei nº 10.406, de 10.1.2002, que instituiu o Código Civil. O art. 538 conceitua a doação: Considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra.
Não paira, pois, qualquer dúvida quando ao fato de a doação se constituir em contrato a título gratuito, que pode, no entanto, se transformar em contrato oneroso, em razão do encargo imposto pelo donatário. Mas, de qualquer forma a doação será tida como ato de liberalidade do doador, seja ela pura ou onerosa (modal). A doação se dá por mera liberalidade, dependendo apenas da aceitação do donatário para o ato se concretize, ato de vontade esse que será tido como aceito, caso o doador fixe prazo para que aja manifestação sobre a aceitação da liberalidade e o donatário não faça a declaração dentro do prazo estipulado de que a aceita, desde que não esteja sujeita a encargo.
Se o motivo que levar o doador a transferir de seu patrimônio bens ou vantagens por merecimento do donatário a doação não perde o caráter de liberalidade, como acontece com a doação remuneratória ou a gravada no que exceder ao valor dos serviços remunerados ou ao encargo do imposto, na forma prevista pelo art. 540. E, no que respeita a forma da transferência de bens ou vantagens do patrimônio do doador ao donatário, esta poderá ser feita tanto por escritura publica lavrada em tabelionato como por instrumento particular, com a exceção prevista no parágrafo único do art. 541, que prevê a validade da doação verbal de móveis de pequeno valor, desde que, para este caso, se dê a tradição.
No caso de doação feita a nascituro, esta deverá atender o que estatuí o art. 542, que prevê a aceitação pelo seu representante legal, o pai, a mãe, ou, no impedimento destes, a quem receber tal encargo por ato judicial. Já para o caso de donatário absolutamente incapaz, é dispensável a aceitação prevista pelo art. 539, quando se tratar de doação pura, isto é, sem estar sujeita a quaisquer encargos. No que diz respeito à doação de ascendente a descendente, ou de um cônjuge a outro, será tida como adiantamento do quinhão que cabe ao donatário na herança. E, tratando-se de doação em forma de subvenção periódica, morrendo o doador o donatário perde esse direito por extinguir-se a doação – o art. 545 prevê a possibilidade evitar que não se extinga a doação com a morte do doador, desde que aja estipulação nesse sentido; nesse caso, dar-se-á a extinção do benefício com a morte do donatário, não o transmitindo aos seus herdeiros.
E, no que tange à falta de aceitação da doação feita com vista a casamento futuro com certa e determinada pessoa, pelos nubentes entre si, ou por terceiro, para um deles ou para ambos, ou para seus futuros filhos, o ato pode ser impugnado; esse tipo de doação deixará de ter efeito no caso da não realização do casamento, como prevê o art. 546, já que essa liberalidade feita, nesse caso, teria por objetivo a sua realização, na primeira parte do artigo, e, na sua segunda parte, a formação da família, com a formalização do ato (casamento).
Outro caso em que a doação poderá perder a sua eficácia está relacionada com a morte do donatário, estando vivo o doador, desde que esteja estipulado no ato da doação – escritura pública ou contrato particular – de que, este, sobrevivendo aquele, os bens doados voltam ao seu patrimônio. O art. 547 não obriga a que se estipule a cláusula de reversão, no caso em que o doador venha a sobreviver ao donatário, dá-lhe tão-somente a faculdade de fazê-lo. Quanto à reversão em favor de terceiro, tal possibilidade é vedada pelo parágrafo único do artigo.
Por outro lado, a doação não poderá ser feita, como estatui o art. 548, que envolva todos os bens do doador; este ao fazer a transferência de bens de seu patrimônio deverá ter a cautela de reservar para si parte deles ou de renda que possa ter para a sua subsistência. Sendo desrespeitada essa norma jurídica, a doação é nula de pleno direito; ao doador caberá pleitear em juízo essa declaração de nulidade, para que lhe seja restabelecida a titularidade dos bens que foram objeto da doação nula.
O contrato de doação será igualmente nulo se o doador transferir de seu patrimônio, por essa liberalidade, bens ou vantagens que excedam a parte que, nesse momento, poderia dispor em testamento, como dispõe o art. 549. [O testador não poderá dispor de mais da metade da herança, havendo herdeiros necessários (art. 1.789 do CC)]. Em outro caso, qual seja, a doação do cônjuge adúltero ao seu cúmplice, dará ao outro cônjuge, ou aos seus herdeiros necessários, o direito de ação para pedir a anulação do contrato (art.550). Neste caso, o prazo de prescrição é de dois anos, a contar da dissolução da sociedade conjugal.
Havendo mais de um donatário, a doação em comum entende-se distribuída em partes iguais, não existindo declaração em contrário; portanto, sem a possibilidade de beneficiar um em detrimento de outro, por constituir-se essa a regra do art. 551. O parágrafo único desse artigo assim dispõe: Se os donatários, em tal caso, forem marido e mulher, subsistirá na totalidade a doação para o cônjuge sobrevivo.
Para o doador não há obrigação em pagar juros de mora, que também não estará sujeito às consequências da evicção ou do vício redibitório, mas, nas doações para casamento com certa e determinada pessoa, não havendo disposição em contrario, responderá pelo vício da evicção, na forma disposta pelo Código Civil, art. 552.
O donatário, por sua vez, ao aceitar a liberalidade estará obrigado a cumprir os encargos da doação, sendo estes em benefícios de quem estipulou a doação, de terceiro, ou do interesse geral, consoante disposição do art.552. E, como prevê o parágrafo único do artigo, se a doação se der em benefício do interesse geral e o contrato de doação não tiver sido executado, o Ministério Público poderá fazê-lo, após a morte do doador. Diga-se, ainda, que caducará a doação feita a entidade futura se em dois anos não estiver constituída regularmente, como estatui o art. 554 do Código Civil.
  

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