4 de out. de 2015

[Direito de Família] Anulação de Casamento



– PEDRO LUSO DE CARVALHO                                                                                                                

No dia 16 de julho de 2015, a Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, tendo por relator o Des. Alzir Felippe Schmitz, julgou a Apelação Cível nº 70064617703, da Comarca de Sobradinho, recurso que foi interposto pelo Ministério Público, na ação de anulação de casamento ajuizada por ASP em desfavor de CVP, que foi julgada procedente; o MP alega que não foi produzida prova de erro essencial, nos termos do artigo 1.557, inciso I, do Código Civil, para embasar a sentença que anulou o casamento das partes. A sentença recorrida foi modificada por decisão unânime, como se vê pelo acórdão inteiro teor, que segue:
APELAÇÃO CÍVEL. ANULAÇÃO DE CASAMENTO. INOCORRÊNCIA DE ERRO ESSENCIAL. apelo provido.
Nos termos do artigo 1.557, inciso I, do Código Civil, erro essencial diz com questão relativa à identidade, à honra e à boa fama do cônjuge que, se conhecida antes da celebração do enlace, inviabilizaria o casamento. Ademais, depois do conhecimento da “questão”, a vida em comum há de ter se tornado insuportável para justificar o pleito de anulação de casamento. Ausentes tais requisitos, não há falar em anulação de casamento.
APELO PROVIDO.

Apelação Cível

Oitava Câmara Cível
Nº 70064817703 (N° CNJ: 0167148-07.2015.8.21.7000)

Comarca de Sobradinho
M.P.
..
APELANTE
A.S.
..
APELADO
C.V.P.
..
APELADO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Magistrados integrantes da Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar provimento ao apelo.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des. Luiz Felipe Brasil Santos (Presidente) e Dr. José Pedro de Oliveira Eckert.
Porto Alegre, 16 de julho de 2015.


DES. ALZIR FELIPPE SCHMITZ,
Relator.

RELATÓRIO
Des. Alzir Felippe Schmitz (RELATOR)
Trata-se de recurso de apelação interposto pelo Ministério Público, pois inconformado com a sentença de procedência da ação de anulação de casamento ajuizada por ASP em desfavor de CVP.
Segundo alega, não foi produzida prova a respeito do alegado erro essencial, razão pela qual não poderia o juízo ter acolhido o pleito. Sustenta que a falta de prova do erro dá ensejo à improcedência da ação, pois aforada por advogado habilitado, que não se desincumbiu do ônus probante.
Requer o provimento do recurso (fls. 24/29).
Em contrarrazões, os recorridos argúem ausência de dialeticidade capaz de dar sustento à tese recursal, e, no mérito, pugnam pela manutenção da sentença (fls. 31/37).
Ministério Público opina pela desconstituição da sentença (fl. 35)
Observado o disposto nos artigos 549, 551 e 552 do Código de Processo Civil, em razão da adoção do sistema informatizado.
É o relatório.
VOTOS
Des. Alzir Felippe Schmitz (RELATOR)
Conheço do apelo porque preenchidos os requisitos legais.
Ao contrário do que suscitam os apelados, o recurso não padece de nenhum defeito. Tanto é assim que eles não tiveram nenhuma dificuldade em oferecer as contrarrazões. E mais, tanto compreendi os termos do apelo que os acolherei, como se verá a seguir.
Deste modo, afasto a preliminar suscitada em contrarrazões.

Afasto também a promoção do MP, pois o fundamento do pedido não exige a dilação probatória.

 ASP ajuizou ação de anulação de casamento afirmando que conheceu pouco CVP, casando-se com pessoa que não coincidia com a que imaginava ser noiva.
Todavia, a anulação do casamento por vício da vontade exige o erro essencial quanto à pessoa do outro.
Nos termos do artigo 1.557, inciso I, do Código Civil, erro essencial diz com questão relativa à identidade, à honra e à boa fama do cônjuge que, se conhecida antes da celebração do enlace, inviabilizaria o casamento. Ademais, depois do conhecimento da “questão”, a vida em comum há de ter se tornado insuportável para justificar o pleito de anulação de casamento.
No magistério de Silvio de Salvo Venosa ao comentar o dito artigo a “situação deve ser vista principalmente em relação ao cônjuge que se diz enganado: se tinha conhecimento ou as circunstâncias denotavam que devia saber com quem estava se casando, não se anula o casamento”.
Ou seja, além dos requisitos legais, há que se perquirir se o cônjuge que se diz induzido em erro teria condições de conhecer as questões que o levaram a pedir a anulação do casamento antes do enlace.
Basta ler a petição inicial da ação de anulação para compreendermos que a autora-apelada se enganou porque quis. Vejamos:
Primeiro, porque o namoro e noivado duraram, no dizer da própria “pouco tempo” (fl. 2). Quem casa com quem conhece pouco assume o risco de casar com quem não conhece.
Segundo, porque assim que ASP se dispôs a entender quem era o marido, logrou êxito. Conversando com ex-namoradas do marido ficou “surpresa quando ouviu sua própria história pessoal de vida retratada na vida daquelas outras mulheres, ou seja, os fatos se repetiam”, afirmou textualmente a apelada na fl. 4 da petição inicial.
Se os fatos se repetiam era porque estavam ao dispor de ASP, que deixou de colhê-los por opção. Não podemos esquecer que estamos tratando de um caso ocorrido em uma cidade pequena, onde é muito fácil obter informações sobre as pessoas.

Não quero dizer que o casal deve permanecer casado mesmo depois da decepção. Entretanto, a decepção com o marido dá ensejo ao divórcio, não à anulação de casamento.
Nesse sentido:
APELAÇÃO CÍVEL. ANULAÇÃO DE CASAMENTO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INOCORRÊNCIA DE ERRO ESSENCIAL. DOUTRINA. PEDIDO ALTERNATIVO DE DECRETAÇÃO DE DIVÓRCIO DEDUZIDO EM SEDE RECURSAL. IMPOSSIBILIDADE. 1. Os fatos que dão causa ao pedido não se prestam a caracterizar hipótese de erro essencial sobre a pessoa do outro. 2. Se a opção pela rápida celebração do casamento com pessoa que conheceu por site de relacionamento retirou do autor a possibilidade de convivência prévia para conhecer a personalidade instável da requerida, não há falar em anulação de casamento. As hipóteses do art. 1.557 do CCB que caracterizam erro essencial constituem numerus clausus, descabendo interpretação extensiva. No caso, não configurado erro de identidade, honra e boa fama. 3. Quanto à doença mental grave, necessária prova técnica que não há nos autos, confirmando a hipótese, bem como a circunstância de preexistência ao casamento. 4. Não se cogita de provimento ao recurso para decretar o divórcio, uma vez que deduzido somente em sede recursal. Nem mesmo com a justificativa de atenção ao princípio da economia processual seria possível o acolhimento do pedido, pois a autora, quando citada, não teve ciência de tal pretensão. NEGARAM PROVIMENTO À APELAÇÃO. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70039523204, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em 13/01/2011)

Enfim, não parece ter havido erro quanto à identidade do cônjuge, honra ou boa fama, tampouco foi provada a insuportabilidade da vida comum. E apenas para não passar em branco, os fatos narrados pela autora não autorizam presumir a exigida insuportabilidade da vida conjugal. Quem foi ou é casado sabe que com o tempo todos os cônjuges têm que se adaptar ao outro.
Não posso deixar de registrar que a autora-apelada é mulher inteligente, servidora pública, com quarenta anos de idade, que assumiu o risco ao casar com que não conhecia. E, rogando vênia a entendimento diverso, isso não enseja a anulação do casamento, razão pela qual dou provimento ao apelo para julgar improcedente a ação.
Esclareço - por derradeiro - que a concordância do demandado com o pedido não conduz à procedência da ação, pois na anulação do casamento temos que preservar o interesse público.
Isso posto dou provimento ao apelo.



Dr. José Pedro de Oliveira Eckert (REVISOR) - De acordo com o(a) Relator(a).
Des. Luiz Felipe Brasil Santos (PRESIDENTE) - De acordo com o(a) Relator(a).

DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS - Presidente - Apelação Cível nº 70064817703, Comarca de Sobradinho: "DERAM PROVIMENTO AO RECURSO. UNÂNIME."


Julgador(a) de 1º Grau: LUCIANE INES MORSCH GLESSE




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